sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Teletrabalho e o trabalho em domicílio


Foi-se o tempo em que – em relação ao local - o trabalho do empregado era exercido, basicamente, de três formas: interno, externo ou um misto das duas anteriores. A primeira forma era exercida pelos empregados que desenvolviam suas atribuições integralmente dentro das instalações das empresas (aqui incluído os terceirizados), a segunda  inteiramente fora delas e a terceira quando parte era desenvolvida internamente e parte fora.

Com o avanço tecnológico, essa realidade começou a mudar e quanto mais acelerado foi esse avanço, novas situações possíveis nasceram para que os empregados pudessem desenvolver suas atribuições e responsabilidades profissionais.

Surgiu o trabalho em domicílio e as novas tecnologias de comunicação, especialmente a telefonia celular, internet, microcomputador e os notebooks, consolidaram novas formas no relacionamento entre muitas empresas e seus empregados, bem como entre estes e as partes relacionadas (ex: clientes externos e internos, fornecedores, bancos, etc).

Para que possamos abordar alguns aspectos interessantes dessa realidade, hoje presente em quase todas empresas, precisamos ressaltar e contextualizar que nos referimos ao teletrabalho e o trabalho em domicílio.

Apesar de existirem inúmeros conceitos e definições desenvolvidas por especialistas para o teletrabalho, tomamos uma apresentada no site da Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades (http://www.sobratt.org.br/faq.html#p06) a saber:é todo e qualquer trabalho realizado a distância (tele), ou seja, fora do local tradicional de trabalho (escritório da empresa), com a utilização da tecnologia da informação e da comunicação, ou mais especificamente, com computadores, telefonia fixa e celular e toda tecnologia que permita trabalhar em qualquer lugar e receber e transmitir informações, arquivos de texto, imagem ou som relacionados à atividade laboral.”

Já o trabalho em domicílio, conforme apresentado no boletim 06 / 2012 (Manual de Procedimentos – Trabalho e Previdência), página 3, conceitua-se como sendo “aquele que é prestado fora do âmbito da empresa, na residência do empregado, ou em oficina de família, por conta do empregador que o remunere”, lembrando “que o trabalhador em domicílio não pode ser confundido com o empregado doméstico, nem com o trabalhador autônomo”.

Podemos depreender pelos conceitos retros que nem todo teletrabalho é trabalho em domicílio, como também nem todo trabalho em domicílio é teletrabalho, mas ambos são espécies de trabalho à distância, muito embora tais formas possam se conjugar.

 
Aspectos positivos, negativos  e controvérsias

É evidente que os novos meios tecnológicos e o trabalho em domicílio podem facilitar o dia-a-dia das empresas e de milhares de profissionais. Entre outras circunstâncias favoráveis podemos destacar:

·         maior flexibilidade de horários;

·         eliminação de gastos com transporte e riscos no percurso até a empresa,  o que resulta também na diminuição da poluição e dos congestionamentos viários;

·         agilização da comunicação e da circulação de atividades e informação;

·         perspectiva de melhoria na vida privada do empregado através do maior convívio familiar;

·         maior inclusão de pessoas com dificuldades  de locomoção;

·         possível redução do desemprego através da não limitação do espaço da empresa; e

·         incremento da produção e diminuição de seus custos.

Evidentemente, esse novo cenário também apresenta aspectos desfavoráveis e/ou desvantagens tais como:

·         isolamento do empregado do ambiente empresarial;

·         maior dificuldade com padronização da produção;

·         possíveis problemas com aspectos relacionados à segurança do trabalho (ex: ergonomia, esforços repetitivos, má postura, etc);

·         maior risco de desídia;

·         riscos de concorrência com o empregador e/ou quebra de sigilo profissional;

·         dificuldade de fiscalização; e

·         informalidade e exploração do trabalhador.

Outrossim, em muitas situações, as vantagens anteriormente destacadas também podem significar problemas futuros (reclamações trabalhistas) para as empresas se não forem tomados alguns cuidados específicos, especialmente a partir da edição da Lei nº 12551, que entrou em vigor em  16/12/2011, com a nova redação dada ao artigo 6º da CLT:

"Art. 6º - Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.

Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio."

Com tal alteração, entre outros, levanta-se o seguinte questionamento: como a Justiça Trabalhista passará a interpretar situações em que - por exemplo - o funcionário permaneça com o celular fornecido pela empresa fora do expediente e/ou tenha acesso a e-mail, por qualquer tipo de tecnologia as 24 horas do dia?

Possivelmente, esse exemplo, hoje em dia uma situação comum em milhares de empresas, não seria suficiente – sem aprofundamento dos fatos - para caracterizar a hora extra, já que a simples  troca de um telefonema ou e-mail entre empregado e empresa fora do expediente sem a obrigatoriedade da resposta imediata não seria suficiente para confirmar que o empregado estava “à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens”, conforme prevê o artigo 4º da CLT.

De outro lado, se houvesse a caracterização de que o funcionário estaria executando ordens e estas estivessem além da jornada de trabalho, aí sim estaríamos diante da sujeição às horas extras. Assim é também no caso em que o empregado fique aguardando ordens, situação em que configurar-se-ia o “sobreaviso”, conforme previsto no artigo 244, parágrafo 2º da CLT, o qual estabelece:

“Considera-se de “sobreaviso” o empregado efetivo, que permanecer

em sua própria casa, aguardando a qualquer momento o chamado para

o serviço.”

Destaque-se, por outro lado, que o TST já se pronunciou em relação ao telefone celular na súmula nº 428, concluindo que o uso do aparelho por parte do “empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço.

Podemos inferir que quando o empregado porta o celular, notebook, tablet, etc, mas tem a liberdade de locomoção para assuntos pessoais ou lazer, não haveria o sobreaviso.

Parece-nos, pois, que ao conceder um aparelho de comunicação para o funcionário, o risco não está na disponibilização da ferramenta para o trabalho em si, mas na forma como ela será utilizada.
 

Trabalho na empresa X trabalho em domicílio

Como princípio, o trabalho em domicílio é equiparado ao trabalho prestado na empresa para todos os efeitos de aplicação da legislação trabalhista. Bastará apenas a caracterização dos pressupostos da relação de emprego (artº 3º da CLT), ou seja: pessoalidade, continuidade, onerosidade e subordinação jurídica.

Outrossim, com a nova redação do parágrafo único do artº 6º da CLT, também não podemos nos esquecer que “os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio." (grifo nosso).
 

Jornada de trabalho

Em relação à questão da jornada de trabalho do trabalhador em domicílio, deve ser estabelecido da mesma forma que é a do empregado da sede da empresa. Ocorre, porém, que muitas vezes, o trabalhador à distância, para alcançar as metas propostas terá que trabalhar mais horas semanais e é aí que poderão surgir problemas.

Tentando antecipar-se aos prováveis futuros problemas jurídicos no que se refere ao pagamento de horas extras, existe um projeto de lei no Congresso Nacional (nº 4.505/2008) visando a regulamentação abrangente do trabalho à distância e um de seus artigos (6º, parágrafo único), estabelece que “em razão do caráter de controle de jornada aberta e, via de regra, de forma virtual, aos empregados teletrabalhadores não será contemplado o direito às horas extras, devendo a remuneração ajustar-se às horas normais de trabalho.

Particularmente, acho que, dificilmente esse dispositivo prevalecerá até a aprovação do projeto.

Em relação aos empregados que ocupam cargos de confiança (diretores e gerentes), pela natureza das atribuições e pelo regime de dedicação, compactuo com aqueles que entendem que os  mesmos não fazem jus ao recebimento de qualquer retribuição pelo excesso de jornada de trabalho diária / semanal.
 

Considerações Finais

Todos esses comentários e considerações objetivam apenas alertar os leitores sobre algumas das principais questões sobre o tema e incentivar o aprofundamento das análises e discussões.

Diante de tudo que pudemos observar, todos os fatores apresentados devem ser considerados pelas empresas na celebração dos contratos de teletrabalho e/ou trabalho em domicílio, devendo, as partes, sujeitarem-se à observância dos limites estabelecidos nas leis trabalhistas e aos princípios que as norteiam, atentando para os padrões éticos de conduta e na boa fé na elaboração, realização e rescisão dos citados contratos. 

Bom trabalho e até breve!
 
 
Autor: Carlos A. Zaffani   -   Consultor em Gestão de Empresas

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Liderando e gerenciando grandes mudanças

Certamente a reengenharia, downsizing, rightsizing, programa de redução de custos e despesas, corte de pessoal, eliminação de níveis hierárquicos, fechamento de fábrica, alienação de ativos, fusão, incorporação, parceria, terceirização de atividades, entre outras, já fizeram (pelo menos algumas delas), parte do receituário de medidas utilizado, pela grande maioria das empresas brasileiras, independentemente do porte, posicionamento no mercado, capacidade financeira ou de gestão e competência de suas lideranças.   

Observamos que isso passou a ocorrer com maior intensidade a partir da última década do século passado, principalmente como decorrência do rápido avanço tecnológico verificado em todas as áreas e em todos os segmentos empresariais, o que exigiu dos empreendedores e gestores em geral,  muita criatividade,  determinação e coragem para manterem vivas, as empresas sob seus comandos. A verdade é que, em muitos e muitos casos, as técnicas ou medidas aplicadas não foram suficientes e as empresas sucumbiram diante dos desafios e imposições desse novo tempo. 

Em realidade, parece chegar um momento na vida de toda empresa em que as alternativas e medidas de gestão conhecidas já foram testadas e, se por algum tempo, apresentaram algum resultado, deixam a impressão de que foram insuficientes para restabelecer a plena confiança à seus investidores, colaboradores e mercado em geral e permitir sua continuidade com segurança e perspectivas saudáveis em relação ao futuro.
    
Mas o que fazer diante de tão duro diagnóstico?

Certamente não temos uma resposta conclusiva e definitiva, porém a experiência tem nos mostrado que quando uma empresa  chega à essa conclusão, um de dois caminhos devem ser trilhados:

1.      continuar aplicando técnicas de gestão conhecidas para maximizar o capital investido, incrementar suas vendas, cortar ainda mais seus custos e despesas e aumentar a produtividade; ou

2.      compreender que chegou o momento de implementar grandes mudanças e transformações na empresa.

Na maioria das vezes, com a adoção do primeiro caminho será possível obter mais alguns resultados positivos, porém, após algum tempo, o “círculo vicioso” conduzirá o negócio à uma situação parecida a que está sendo vivenciada e que obrigará, outra vez, à uma nova tomada de posição. Esse “circulo vicioso” se repetirá enquanto forem conseguidas “respostas positivas” às ações implementadas, porém é previsível imaginar um final pouco feliz para a história das empresas que optam por esse caminho!

Assim, entendemos que o segundo caminho é o mais apropriado e nesse sentido, concordamos com o professor John Kotter da Harvard Business School que propõe oito fases na condução de um processo de grandes mudanças, a saber :


  1. SENSO DE URGÊNCIA   

É preciso estabelecer um senso de urgência diante da situação, examinando todos os contextos, principalmente o mercado de atuação e os concorrentes existentes.

Nessa fase, também deve-se buscar a identificação e discussão dos problemas atuais e daqueles já vivenciados, dos problemas potencialmente mais graves, bem como das oportunidades existentes, sempre lembrando que as épocas de crises são excepcionalmente geradoras de grandes oportunidades.


  1. ALIANÇA / ACORDO DE ORIENTAÇÃO

Definir e constituir um grupo de trabalho com poder e liderança suficientes para comandar e implementar as mudanças necessárias.

Esse grupo de trabalho deve atuar com espírito de equipe, estar plenamente comprometido com a causa e manter-se atento à cada fase do processo de mudança.


  1. DESENVOLVIMENTO DA VISÃO E DA ESTRATÉGIA

Desenvolver a criação da visão necessária que irá ajudar no direcionamento dos esforços de mudança e definir as estratégias que irão compor o conjunto de medidas que viabilizarão a consecução da visão.


  1. DIVULGAÇÃO DA VISÃO DE MUDANÇA

Empregar todos os meios possíveis na divulgação da nova visão e das estratégias, de forma que os colaboradores da organização, em todos os níveis,  possam absorver integralmente a mudança desejada, no menor tempo possível.

É nesta fase que se deve modelar a reação e comportamento esperado em relação aos colaboradores, tendo como base as atribuições do grupo de trabalho mencionado na fase dois acima.  


  1. DELEGAÇÃO DE PODERES

As ações necessárias podem requerer direcionamentos pouco receptivos ou agradáveis, o que impõe a atribuição de poderes, ao grupo de trabalho, com ampla margem de ação e de decisão para remover toda espécie de dificuldades ou barreiras, alterar sistemas e processos que eventualmente possam arruinar ou abalar a visão da mudança.

O grupo de trabalho deverá ser estimulado à assumir riscos, bem como estar plenamente receptivo às idéias, atividades e ações não tradicionais.


  1. AÇÕES QUE PROPICIEM GANHOS NO CURTO PRAZO

Devem ser priorizados os planejamentos que direcionem perspectivas de melhorias no desempenho da empresa, de forma que as ações implementadas possam gerar ganhos no curto prazo.

Também nesta fase, devem ser desenvolvidos programas de reconhecimento e recompensa aos colaboradores que viabilizarem tais ganhos. Os reconhecimentos e recompensas devem ser amplamente percebidos em todos os níveis da organização.


  1. CONSOLIDAÇÃO E GERAÇÃO DE NOVOS GANHOS

Na medida em que todos os membros da empresa vão percebendo os resultados positivos, a credibilidade sobre novas ações aumenta e com isso encontram-se menos resistências para implementar mudanças nos sistemas, nos processos, na estrutura e nas políticas vigentes que não mais estejam em consonância  com a nova visão de transformação.

Essa fase impõe a necessidade do desenvolvimento e promoções de colaboradores suficientemente capazes de implementar a visão de mudança e não é rara a necessidade de buscar profissionais fora da organização, pois muitas vezes as competências internas são insuficientes para desenvolver e implementar a nova visão.

Adicionalmente, é também neste estágio, que se observa a necessidade de realimentar ou revigorar o processo de mudanças, seja com o desenvolvimento de novos projetos, novos temas e/ou agentes de mudanças.


  1. INTRODUZIR A NOVA ABORDAGEM NA CULTURA DA EMPRESA

É nessa fase que, o aprimoramento do desempenho,  comportamento orientado no foco do cliente, maximização da produtividade, viabilização de lideranças  mais capazes e obtenção de uma maior eficácia gerencial são fortemente trabalhadas.

Também devem ser desenvolvidas as articulações das conexões entre as novas posturas e comportamentos requeridos e o sucesso da empresa.
Por fim, serão buscadas formas apropriadas para o desenvolvimento dos meios que assegurem a formação de novas lideranças, bem como preparação das bases para sucessão.

Muito embora o professor Kotter considere essa a última fase, particularmente, entendo que esse processo deve, dentro do possível, ser gradualmente incorporado durante a implementação das ações nas fases anteriores até porque a cultura existente na empresa estará sendo constantemente questionada e as novas posturas e condutas requeridas estarão, por si mesmas, edificando ou pelo menos reconstituindo uma nova cultura organizacional.


Considerações Finais

A história tem mostrado que programas visando grandes mudanças e transformações, muitas vezes, não são bem sucedidos por razões as mais diversas, porém entre as maiores resistências encontramos:

·        Cultura organizacional muito forte;
·        Processos rotineiros com longa história de sucesso;
·        Definição de grupos incapazes ou sem poder suficiente para implementar as mudanças chaves;
·        Nova visão não apresenta mudanças ou transformações que criem a motivação necessária;
·        Estratégias mal concebidas;
·        Medo ou receio de mexer em sistemas / estruturas muito enraizadas;
·        Canais de comunicação e divulgação fracos ou insuficientes;
·        Perda do timing para criação de condições para geração de ganhos no curto prazo;
·        Incapacidade de produzir novas mudanças.

Para reflexão   -   E você, caro leitor: em que momento está sua empresa?  Será que as medidas que vêm sendo tomadas na gestão de seu negócio são consistentes o suficiente para gerar expectativas positivas numa visão de longo prazo?  Como você quer ver sua empresa daqui um, cinco e dez anos?

Autor: Carlos A. Zaffani  -  Consultor em Gestão de Empresas