quinta-feira, 22 de junho de 2023

Preço: Uma questão de vida ou morte!

 Hoje em dia, com poucas exceções, praticamente todos os segmentos de negócios apresentam um alto grau de competição. Assim, podemos afirmar que a hiper competição está presente no mundo empresarial, fazendo parte do dia-a-dia de todos os gestores.


Seja pelo advento de novas tecnologias que capturaram parcelas significativas do mercado de determinados segmentos, seja pela criação e/ou entrada de novas empresas, seja pela visão equivocada e distorcida de muitos empresários e executivos que super dimensionaram o potencial do mercado, fizeram vultosos investimentos em novos equipamentos e acabaram gerando excesso de capacidade instalada ou seja pela migração de valor provocada por novas soluções que atenderam melhor as necessidades dos clientes, a verdade é que a maioria das empresas operam em setores que apresentam elevados graus de concorrência, incentivando e levando muitos gestores  à prática de preços inconsequentes que culminam, em muitas ocasiões, na destruição dessas organizações.

Será que uma política de preços baixos é a melhor solução para manter-se no mercado, reconquistar clientes perdidos, ser lucrativa, dispor de capital de giro próprio e gerar caixa operacional suficiente para novos investimentos e crescimento?

A história nos apresenta inúmeros exemplos em que o preço foi fator decisivo para implementação bem sucedida de determinadas estratégias mercadológicas.  Nessa direção, lembro-me sempre da estratégia adotada - há anos - por um dos maiores fabricantes de papéis de nosso país, o qual, para entrar no mercado de um determinado tipo de papel (até então dominado por outros dois tradicionais fabricantes), simplesmente derrubou o preço vigente, marcou sua presença e rapidamente conquistou parcela expressiva desse mercado.  Em outras palavras, a empresa “comprou” uma fatia desse mercado!

Se uma estratégia baseada no preço foi decisiva para aquela situação, tenho comigo que quase sempre não será!


  • Estrutura, custos, despesas e margens
De maneira geral, apesar de reconhecer que as diferenças tecnológicas - existentes entre empresas concorrentes - foram substancialmente reduzidas nos últimos anos,  é sabido que as estruturas internas, custos de produção, despesas operacionais e margens requeridas individualmente podem apresentar grandes diferenças, o que per si, são fatores suficientes para  não permitir que ninguém fixe ou determine o “seu  preço”.

É comum ouvirmos, entre outras coisas, que “o mercado só compra preço”, ou “eles têm condição de fazer esse preço porque possuem uma estrutura enxuta”, ou então, “eles compram grande quantidade de matérias primas e por isso conseguem preços melhores que os nossos”, ou ainda, “eles trabalham meio na informalidade e sonegam impostos”.   A verdade é que cada empresa tem a sua realidade e por mais parecidas que sejam tecnologicamente, diferenças importantes sempre existirão e, muito embora o mercado crie um referencial limitador, entendo que jamais uma organização vencedora deverá ter no preço seu principal argumento de vendas.

Portanto, apesar do elevado nível de competição, o grande desafio dos gestores não está na busca da destruição da concorrência, mas sim no sucesso das estratégias de posicionamento no mercado. Cada empresa deve desenvolver e dispor de mecanismos gerenciais internos para não se deixar levar pela tentação de ter o “preço” como principal estratégia de venda ou tábua de salvação.


  • Formação do preço
Didaticamente, numa indústria, podemos dizer que o preço é composto pelos custos de produção + despesas + margem de lucro. Hipoteticamente, se uma empresa produz um único produto e apresenta:

    • Custos de produção (Materiais, Mão-de-obra e Gastos gerais de fabricação) de $ 500;
    • Despesas (Vendas, Administrativas, Financeiras e Gerais) de $ 300; e
    • Objetiva um lucro líquido antes dos impostos de 20% do valor da venda líquida (após dedução dos impostos);
o preço de venda será de $ 1.000, cujo resultado ficaria assim demonstrado:
                                                            
Venda Líquida........:1.000
(-) Custo de Produção:   500
(=) Lucro Bruto:   500
(-) Desp.Operacionais:   300
(=) Lucro líquido:   200
% de lucro:  20%


Pela simplicidade do exemplo queremos mostrar que apesar das três variáveis  (custos, despesas e lucro), geralmente a margem de  lucro é a primeira afetada quando opta-se pela redução do preço nas negociações, até porque hoje em dia a grande maioria das estruturas das empresas já passaram por vários processos de reengenharias ou  reestruturações o que limita fortemente qualquer margem de manobra.

Assim, na sequência do mesmo exemplo, se a empresa tem um cliente que não aceita nenhuma argumentação que não seja o preço e como tal se dispõe a pagar só $ 800 e mesmo assim ela deseja fechar essa venda não terá outra alternativa a não ser buscar reduções  adicionais nos custos de produção, nas despesas e comprometer ou até anular a margem de lucro.

  • Como evitar a tentação da utilização de estratégia de venda baseada no preço
Shapiro, especialista em Vendas e Marketing de Harvard há anos já apresentava algumas recomendações para evitar que os outros (clientes ou concorrentes) estabeleçam o seu preço:

1.   Crie valor para o seu cliente através :

  • do desenvolvimento de motivos e significados  ( conveniência, disponibilidade, funcionalidade e relacionamento ) que levem-no a querer fazer negócio com sua empresa; e
  • da eliminação de qualquer motivo que levem-no a não querer fazer negócio com sua organização (ex: problemas com prazo de entrega, transporte, cobrança, etc).

2.  Escolha seus clientes ou concentre-se naqueles em que a percepção do valor oferecido seja mais forte, pois é cada vez mais reconhecido pelos gestores que é impossível manter a excelência e serviços excepcionais para todos os clientes e em todas as negociações.

3. Seja diferente, principalmente naquelas situações em que as circunstâncias o pressionarem para definir uma negociação baseada apenas no preço.  Buscando a diferenciação em relação à concorrência poderá estar sendo criada a desejada diferenciação de valor que será percebida  pelo cliente.

4.  Administre inteligentemente sua linha de produtos ou serviços, pois é muito comum empresas desenvolverem tantas variações na oferta -  com diferenças tão insignificantes - que acabam influenciando e encorajando os clientes a comprarem os produtos ou serviços mais baratos, os quais  muitas vezes, apresentam menores margens.

5.  Pratique preços que reflitam adequadamente a quantidade e qualidade do valor  (produto ou serviço) oferecido pois em toda negociação existirá a possibilidade de se aplicar  um preço justo e proporcional a tal valor.

Segundo Shapiro, mesmo as empresas que conseguiram aplicar essas cinco primeiras recomendações encontraram dificuldades na implementação das duas subseqüentes. Vamos a elas:

6.   Cumpra todas as promessas que fizeram o cliente perceber a diferenciação do valor oferecido, pois se isso não ocorrer, o mesmo terá muitas razões para concentrar-se exclusivamente no preço. Ao ter suas expectativas plenamente atendidas, o cliente tenderá a ser bem mais flexível na negociação dos preços.

7.  Tenha coragem...sempre!  Principalmente nas grandes negociações, os clientes “batem” fortemente na questão preço. Por isso, é preciso mostrar coragem, uma vez que é mais fácil ser tentado a manter o cliente ou participação no mercado através da redução do preço.

Na realidade, quase todas as recomendações requerem coragem, pois não é fácil escolher e descartar clientes, como também é difícil desenvolver e ser percebido pela diferenciação do produto ou serviço oferecido.


  • Considerações finais
Todos sabemos que empresários, executivos e gestores enfrentam, diariamente, as mais variadas formas de pressão na condução de suas empresas e o preço a ser praticado no mercado representa sempre um grande desafio que requer estruturas enxutas, competência, informações gerenciais consistentes, monitoramento constante, equilíbrio e sensatez.  Mesmo com tudo isso, você será tentado a reduzir o preço em muitas circunstâncias. Por isso, concordo plenamente com Shapiro quando afirmou:

            “ O que mais exige coragem, no entanto, é ser diferente. Coragem para
            superar o medo de ser diferente é um artigo muito escasso,  mas   quem
            a tiver será regiamente recompensado. É essa diferença que permitirá a
            você fazer o seu preço e não deixar que o façam por você.”  

Portanto, não caia na tentação!

Autor: Carlos A. Zaffani  -  Consultor em Gestão de Empresas

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2023

Cuidados a serem tomados na construção de sua carreira profissional

Entrevista que, há alguns anos, concedi para a intranet de uma grande instituição financeira e que, posteriormente, também foi publicada no site do Cenofisco. Nela, abordo vários aspectos sobre os cuidados a serem tomados na construção de uma carreira profissional, bem como em relação aos ciclos dessa trajetória. 

Entendo que as abordagens e recomendações continuam válidas!





1 – Muitas pessoas acham que os anos passam rápido demais. Isso é verdade ou somos nós que decidimos o ritmo de nossas vidas?
R:  Inicialmente, a sensação do tempo passando rápido demais é uma realidade cada vez mais presente em nossos dias  - especialmente para quem vive nas grandes cidades - porque estamos expostos a inúmeros “agentes” (trabalho, estudo, trânsito, insegurança, meios de comunicação, Internet, etc) que atuam como aceleradores de nossa vida. De outro lado, cada um de nós pode dosar tal “aceleração” através de atitudes, posturas e comportamentos que exigem disciplina, persistência, serenidade e muita dedicação pessoal. 


2 – Se colocarmos o pé no acelerador, não corremos o risco de deixar passar coisas importantes? E se pisamos no freio não podemos levar a vida em marcha lenta, o que pode ser fatal para a carreira?
R:  Assim como na direção de um veículo possante, se acelerarmos demasiadamente, poderemos até chegar mais rápido no destino, porém correremos o sério risco de provocarmos um acidente e demorarmos muito mais para chegar onde desejamos. Por isso, sou partidário do equilíbrio na dosagem com que programamos a nossa jornada de vida profissional, ora acelerando na busca dos objetivos de curto prazo e ora mais lentamente, na consecução de nossas metas de longo prazo.
Atualmente, percebo nos jovens, uma necessidade muito forte de crescimento rápido, porém, quase sempre, sem a devida consistência na formação e experiência, o que tem contribuído para muita decepção, tanto para o profissional quanto para as organizações.

3 - Quais são os ciclos da vida profissional? Eles realmente têm a ver com a idade? Qual é a relação que se pode fazer? Como o profissional pode administrar os ciclos?


R:  Podemos sintetizar os ciclos da vida profissional em quatro momentos, ou seja:
·         aqueles que estão iniciando a carreira;

·         aqueles que estão no meio da carreira, porém com falta de perspectivas de crescimento;

·         aqueles que estão no meio de uma carreira ascensional; e

·         aqueles que estão na fase final de suas carreiras


Entendo que não existe uma regra estabelecida em relação à idade, porém da mesma forma que um profissional muito jovem dificilmente chega a um cargo de direção com pouca experiência, um outro com uma certa idade e muitos anos numa mesma posição hierárquica em nível de assistente ou encarregado, alcançará uma posição executiva.

Cada profissional precisa fazer sua autoavaliação sobre o seu momento, onde se encontra e a partir daí, direcionar os passos subsequentes para encerramento ou não de um ciclo.


 4 – Quais são as reflexões mais importantes (ou as perguntas) que deve fazer ao encerrar um ciclo e iniciar outro?


R: Eu diria que , essencialmente, o profissional precisa refletir e responder uma pergunta básica: estou feliz e realizado na minha vida profissional? Se for negativa, faz-se necessário encontrar respostas conclusivas (isso pode ser feito com a aplicação dos “por quês?” até que não exista mais nenhum) e então estabelecer os passos e/ou ações seguintes.
Se a resposta à pergunta básica for positiva, reavalie se seus objetivos continuam claros e continue a jornada.


 5 – Muita gente deixa a decisão sobre suas vidas para amanhã e esse amanhã nunca chega ou chega tardiamente. Tomar decisões e mudar é difícil, mas quais riscos essa postura traz?
R: Na verdade, a maioria dos seres humanos tende a procrastinar suas decisões, “deixando” para outro dia ou para um outro tempo que nunca chega e, com isso, passa a conviver com vários ciclos “em aberto”, os quais acabam contribuindo negativamente nos vários contextos da vida.

Todos nós tomamos decisões em vários momentos de nosso dia-a-dia e não nos apercebemos disso. Todavia, no campo profissional, é comum deixar para amanhã, depois ou nunca e, isso é um dos maiores erros que podemos cometer. Quantos profissionais, por medo ou acomodação, passam a vida infelizes,  simplesmente porque foram incapazes de tomar decisões que envolviam algum risco. Nesse ponto lembro que o risco é parte integrante da trajetória de todo profissional que quer crescer!


 6 – Quais são as consequências da má gestão de carreira?
R: A má gestão de carreira e dos ciclos da vida profissional pode conduzir a pessoa a um estado de exaustão prolongada e consequente diminuição do interesse em relação a todas as coisas que se relacionam ao trabalho. Na medida em que os ciclos profissionais não são fechados, crescem os problemas de relacionamento com as chefias e demais colegas, caem o desempenho e o grau de cooperação com a equipe e aumentam os conflitos internos.

Acredito que as pessoas que conseguem desenvolver uma boa gestão de carreira e dos ciclos da vida profissional se fortalecem e “acumulam energia” que as ajudam a resolver os problemas e superar as barreiras e dificuldades com naturalidade. Apesar de concordar que ser resiliente é uma questão de atitude, tenho certeza que, gerir competentemente a carreira e os ciclos da vida profissional, encerrando-os no tempo certo ou quando as circunstâncias impuserem, irá ajudá-lo a fortalecer seu grau de resiliência.


7 – O que você recomendaria para: os jovens em início de carreira; para aqueles que estão no meio de uma carreira ascensional; para os que estão na fase final de carreira?
R:   Para aqueles que estão em inicio de carreira, recomendo um “planejamento de ciclos”: a estruturação de como se pretende construir a carreira ao longo dos anos. Para tanto, é preciso projetar e estabelecer metas (com prazos) até onde se quer chegar e os meios necessários. Recomendo que jamais se esqueça de que o medo pode ser um dos maiores obstáculos para o encerramento de um ciclo.

Para os que estão no meio da carreira, mas estagnados, minha recomendação é fazer uma “revisão dos ciclos” e planejar os “novos” necessários para uma retomada do desenvolvimento profissional. Para estes lembro que, além do medo, a acomodação pode ser o principal adversário de seu progresso.

Para os que estão crescendo na carreira, recomendo fazer uma “reflexão dos ciclos passados” e a forma como cada um deles foi concluído, extrair os melhores ensinamentos e projetar os “novos”, ainda com maior consistência. Mas, cuidado! 

Com uma carreira vitoriosa até aqui, certamente o medo não marcou presença em sua trajetória, porém não se esqueça que, se de um lado a confiança é uma das principais qualidades dos profissionais vitoriosos, o seu excesso poderá criar uma “cortina” que impedirá a visão realista dos ciclos atuais e futuros de seu desenvolvimento.

Para aquele que está em final de carreira, independentemente se foi um  profissional de grandes conquistas ou não, lembre-se, em primeiro lugar, que o encerramento de uma carreira deve representar apenas o final de um dos ciclos da vida e assim como o nascer do sol anuncia um novo dia, a perspectiva do final da carreira deve ser o incentivo para a formulação de um (ou vários) ciclo(s) que contemple(m) aspectos que possam trazer bem estar, prazer, realização e crescimento interior.

Para quem se encontra nesse estágio da vida profissional, é essencial a formulação de ciclos que privilegiem a família, a sociedade (representada pelos seres humanos mais carentes), a saúde e a espiritualidade.

Bom trabalho e até breve!

Autor: Carlos A. Zaffani  -  Consultor em Gestão de Empresas

segunda-feira, 24 de outubro de 2022

Assédio moral no trabalho: uma violência contra o ser humano!

Nota: Este artigo foi escrito há alguns anos, mas entendo que seu conteúdo continua atual e merece sua leitura e reflexão!

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 I.                   Introdução


Quase todas as pessoas que trabalham há mais de vinte anos, no passado, provavelmente já vivenciaram e/ou, no mínimo, presenciaram algum fato caracterizador do assédio moral e, no entanto e pelas mais variadas razões, mantiveram-se em silêncio ou apenas comentaram veladamente nos seus círculos de relacionamentos mais próximos (dentro ou fora das organizações).

Até poucos anos, muitas circunstâncias caracterizadoras do assédio moral eram quase sempre consideradas (às vezes até mesmo pelos assediados) como “normais” dentro de um ambiente de trabalho, entendendo-as como gozações, “broncas” de chefes, respeito distorcido aos superiores (do tipo “manda quem pode e obedece quem tem juízo”), divergências e/ou diferenças de posicionamento e preferências pessoais ou profissionais. Até então, convivia-se com o assédio e mesmo aqueles que o consideravam como forma de ofensa, menosprezo, constrangimento ou humilhação, continuavam desenvolvendo suas atribuições e responsabilidades e, quando muito, comentavam ou desabafavam com familiares, amigos  e/ou pessoas de sua confiança.

A realidade é que o assunto começou a ser identificado como uma forma de violência moral no trabalho somente na década dos anos de 1980 através de pesquisas realizadas nas áreas da psicologia e psiquiatria por Heinz Leymann, tornando-se objeto de estudos iniciais na Suécia e posteriormente na Alemanha.  Em meados da década seguinte, a OIT (Organização Internacional do Trabalho) chamava a atenção para o problema em diferentes países e mais recentemente, também o Fundo Europeu para Melhoria das Condições de Trabalho e de Vida (Fundo Dublin 2000) reconheceu o assédio moral como um problema internacional.

No Brasil, somente no início da primeira década deste século é que o assunto começou a ganhar força, após a divulgação da pesquisa brasileira realizada como tema de dissertação de mestrado (Uma jornada de humilhações) em Psicologia Social – PUC/SP - Maio/2000, pela Dra. Margarida Barreto. Portanto, muitas das informações constantes deste artigo foram obtidas, e fazemos questão de destacar, no site www.assediomoral.org.br/, o qual foi criado e é mantido por vários profissionais (de diferentes áreas de atuação) preocupados com o problema e engajados na luta contra o fim do assédio moral no trabalho.

 

II.                Assédio moral: o que é? E os impactos sobre o ambiente de trabalho?

De maneira bem simples, podemos definir o assédio moral como sendo aqueles comportamentos abusivos e humilhantes, expressos através de gestos, palavras e atitudes que possam prejudicar a integridade física ou psíquica de uma pessoa, desde que ocorram repetitivamente, os quais, também, acabam contribuindo decisivamente para a deterioração do ambiente interno de trabalho.

 È importante notar que uma ocorrência isolada não caracteriza o assédio moral. Assim, somente situações repetidas e frequentes de comportamentos abusivos e humilhantes caracterizam o assédio moral. Concordamos com aqueles que entendem que um incidente isolado também pode ser caracterizado como um tipo de violência no trabalho, passível, inclusive, de reparação por dano moral, porém não é considerado uma forma de assédio. 

De outro lado, muito embora seja mais comum a ocorrência do assédio de superiores hierárquicos contra seus subordinados (conforme veremos mais à frente), o mesmo também pode ocorrer entre colegas do mesmo nível (ex: colocam em xeque a masculinidade de alguém) e até mesmo entre grupos de funcionários em relação a determinado chefe (ex: espalham boatos negativos sobre o comportamento da esposa do mesmo).

Ambientes de trabalho onde são observados comportamentos de assédio moral são caracterizados, entre outros:

·         pela deterioração nas relações humanas;

·         desrespeito aos princípios básicos da boa convivência;

·         queda na qualidade e na produtividade;

·         maior probabilidade de perda de confiança no comando da organização;

·         falta de comprometimento;

·         aumento do absenteísmo, doenças e acidentes do trabalho;

·         maior rotatividade da mão-de-obra;

·         aumento do número de reclamações trabalhistas;

·         baixos níveis de motivação, criatividade e iniciativa;

·         trabalhadores com baixa “auto-estima”;

·         predominância de atitudes individualistas (falta de espírito de equipe);

·         maior tensão, irritabilidade e agressividade dos trabalhadores.


III.             O que pode caracterizar o assédio moral?

Embora não contemple todas as hipóteses e sempre lembrando que a caracterização do assédio moral depende das reincidências ou frequências com que os fatos ocorrem, segue abaixo, uma série de comportamentos e atitudes que podem ser considerados como tal:
 
  • Ameaçar o empregado constantemente de demissão;
  • Dispensar tratamento preconceituoso contra trabalhadores doentes ou acidentados;
  • Constranger e/ou humilhar publicamente o funcionário;
  • Autoritarismo e intolerância de gerências e chefias;
  • Imposição (repetidas vezes) de jornadas extras de trabalho;
  • Espionar e vigiar os trabalhadores;
  • Desmoralizar e/ou menosprezar os funcionários;
  • Assédio sexual;
  • Isolamento e segregação de trabalhadores por parte de gerências e chefias;
  • Desvio frequente de função;
  • Insultos e grosserias de superiores;
  • Calúnias e inverdades dissimuladas no ambiente de trabalho por chefias;
  • Negação por parte da empresa de laudos médicos ou comunicações de acidentes;
  • Discriminação salarial segundo sexo, etnia ou religião;
  • Ameaças a trabalhadores sindicalizados;
  • Punição aos trabalhadores que recorrem à Justiça;

IV.             O assédio moral e o dano moral

Para muitos interessados no tema, assédio e dano moral são a mesma “coisa”. Todavia, de acordo com o Dr. Robson Zanetti, advogado (Doctorat Droit Privé Université Panthéon-Sorbonne), em artigo no site www.administradores.com.br esclarece que  ao serem analisadas as condenações na Justiça do Trabalho...chega-se a conclusão que não existe um posicionamento claro sobre o assunto”.

Como sempre procuro fazer, não entrarei no mérito de uma discussão jurídica, até porque não é este o objetivo desta abordagem, porém compactuo com aqueles que entendem que assédio moral e dano moral são “coisas” diferentes.

Resumidamente, consegui identificar algumas características específicas de cada um:

            Assédio Moral                                               Dano Moral

 
* Sua caracterização nasceu como uma         * Nasceu como tese jurídica
   tese médica (no campo da psiquiatria)      

* Conduta abusiva, repetitiva e prolongada * Pode ocorrer em decorrência de um fato

* Prejuízo precisa ser provado (ex: doença)  * Prejuízo pode ser baseado na presunção

* Não impõe levar ao conhecimento de        * Em matéria de prova, entende-se ser
   terceiros (como prova)                                   necessário levar ao conhecimento de 3ºs

* Causa de dor e sofrimento comprovados   * Pode não causar dor e/ou sofrimento

Em conclusão a este tópico, parece-me que as características próprias acima destacadas de cada instituto são suficientes para demonstrar tratarem-se de “coisas” diferentes. Assim,  o enquadramento como assédio moral ou dano moral depende, essencialmente, da verificação e análise detalhada dos fatos, de acordo com as provas e informações apresentadas pela pessoa lesada.

V.        O que as empresas podem fazer preventivamente
Vivemos num mundo capitalista, onde a competitividade é incentivada em todos os níveis e contextos dentro das organizações e, infelizmente com isso, contribuindo para ações, atitudes e comportamentos – especialmente por parte dos superiores hierárquicos - que agridem e degradam as relações humanas.
O assédio moral é um ato de violência ao ser humano e deve ser coibido de todas as formas, pois muitas vezes finge-se não vê-lo ou tolera-se determinados comportamentos que o encorajam. Por isso, todas as empresas sérias e responsáveis, independentemente do porte, devem estar atentas ao problema e, como prevenção, podem:
·         Conscientizar seus colaboradores sobre o que é o assédio moral;
·         Criar programas de prevenção;
·         Desenvolver formas mais estruturadas de organização do trabalho e rever seus métodos de gestão das pessoas;
·         Dispor de canais de comunicação mais abertos e incentivando políticas de qualidade de vida;
·         Treinar e preparar pessoal de comando dentro de práticas de gestão que incentivem a educação, confiança, cooperação e respeito humano, de forma que sejam exemplos para todos os colaboradores;
·         Não admitir, em hipótese alguma, atitudes e comportamentos de desrespeito ao ser humano;
V.                Considerações Finais
O assédio moral deve ser repudiado, pois além dos males que representa para as organizações, repercute também na sociedade, atingindo questões familiares, separações conjugais, uso de drogas e alcoolismo, entre outros e invade o campo da saúde pública com o aumento de doentes físicos e mentais.
Todos são responsáveis: patrões, dirigentes, executivos, gerentes, supervisores, chefes ou simples funcionários. Cada um dentro de seu campo de atuação não pode se eximir e se calar.
Eu estou fazendo a minha parte e você?
Autor: Carlos Zaffani   -   Consultor em gestão de empresas

quarta-feira, 23 de março de 2022

A GESTÃO DAS EMPRESAS ESTÁ EM XEQUE!

Redigi este artigo há muito tempo e, ao revê-lo após termos vivido dois anos de pandemia da covid 19 e no meio da turbulência e incertezas em relação as consequências da guerra na Ucrânia, percebo que (em sua essência) continua absolutamente atual diante do momento vivido pelas empresas em nosso país, bem como sob a ótica global.

Para sua análise e reflexão!

Boa leitura!
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Iniciei minha vida profissional, ainda garoto, na segunda metade da década dos anos 1960. Era uma época em que o Brasil, há poucos anos, havia criado uma lei que obrigava a realização da correção monetária do ativo imobilizado anualmente e criava o FGTS (fundo de garantia por tempo de serviço), acabando com a lei da estabilidade para os empregados com mais de dez anos na empresa.

Politicamente, também foi uma época em que o nosso país, com a tomada do poder pelos militares (revolução de 1964), entre tantas coisas negativas, sofreu muita opressão e repressão, prolongada estagnação econômica (principalmente nos anos 80) e crescimento da concentração de renda alimentada pela inflação.

Foi também, poucos anos depois, editada a Lei nº 6404/76, a famosa lei das S/A  (sociedade por ações), a qual representou um grande avanço para investidores, criou mecanismos de controle mais adequados, mas também impôs regras mais exigentes para os gestores da época na prestação de contas e apresentação das demonstrações contábeis e financeiras.

Alguns meses depois criaram-se os primeiros mecanismos de proteção contra a inflação e, entre eles, a sistemática de correção monetária das demonstrações financeiras para as empresas, a qual viria a ser aperfeiçoada em 1977 com o Decreto-Lei nº 1598, através do mecanismo de correção das contas do Ativo Permanente (Imobilizado, Investimentos e Diferido) e do Patrimônio Líquido, cujo resultado era refletido na demonstração do resultado do exercício. Essa sistemática vigorou por muitos anos e embora sendo um alimentador do processo inflacionário, permitiu que muitas empresas brasileiras pudessem crescer e se tornarem “players” com presença internacional.

Enquanto vivenciávamos a nossa realidade tupiniquim, os Estados Unidos expandiu seu poderio econômico de tal forma, que chegou a representar quase um terço do PIB mundial, a presença do capitalismo tornou-se mais marcante mundo afora, o símbolo do regime comunista (muro de Berlim) foi derrubado com as duas Alemanha (Ocidental e Oriental) tornando-se novamente um único país e, entre tantos outros acontecimentos relevantes, também presenciamos a queda de vários governos totalitários, comunistas e socialistas de muitas nações.   

Foram anos importantes na construção da carreira de muitos gestores, os quais ainda continuam na linha de frente de tantas organizações de sucesso. Ao longo das últimas quatro décadas, foi possível acompanhar períodos de estagnação, incertezas, prosperidade, hiperinflação, aquecimento e desaquecimento da economia de tantos países, guerras, conflitos, dissidências, etc.

Essa introdução se faz necessária para ressaltar o momento atual no mundo empresarial, pois apesar de tantos acontecimentos expressivos e importantes, a história recente da humanidade não vivia um período de tamanha incerteza sobre o futuro das organizações e do próprio capitalismo. Empresas consideradas exemplos de gestão sucumbiram, faliram ou estão prestes a desaparecer. No final da década passada, em poucos meses, milhares de empresas espalhadas pelo mundo perderam valor patrimonial equivalente a parte substancial do PIB mundial, significando muitos trilhões de dólares que simplesmente “evaporaram” das mãos de seus investidores.

É aí que vem a questão: até onde faltou competência e capacidade de previsão para os gestores das organizações? Se sabemos que os principais executivos de muitas dessas empresas que foram a bancarrota ou perderam valor substancial eram profissionais de reconhecida capacidade, formados pelas principais universidades do mundo, especializados, pró-graduados, MBA´s, mestrados, doutorados e Phd  pagos a peso de ouro, por que tudo isso não foi suficiente para salvar tantas grandes organizações?

A resposta não é fácil (se é que podemos encontrar uma efetiva) e vai muito além de qualquer tentativa simplista de buscá-la, especialmente se considerarmos o pequeno espaço destinado para este artigo. Então, a realidade nos conduz para uma conclusão: a gestão das empresas está em xeque!

Diante desse quadro de incertezas em relação ao futuro e de questionamentos sobre os modelos e estilos de gestão das organizações, o que é possível fazer?

Mais uma vez não temos uma resposta objetiva, mas podemos tentar construir uma proposta sensata para conviver nesse “turbilhão de emoções” e começar a visualizar a perspectiva do surgimento de novos modelos e estilos de gestão que privilegiem integralmente o ser humano, muito acima dos lucros a qualquer custo e dos ganhos astronômicos  e absurdos atribuídos a executivos descompromissados com a construção de um mundo melhor e menos desigual.

Uma projeção para o futuro da gestão empresarial

1. Em primeiro lugar, é preciso reconhecer que as escolas de base precisam educar e preparar os alunos para uma vida em sociedade, onde, apesar das diferenças de raça, cor, credo religioso e objetivos pessoais, cada pessoa tenha a plena consciência de que sua auto-realização e felicidade dependerá  da realização e felicidade do outro.

2. Em segundo lugar, é essencial que as escolas de formação passem a ter como missão, a educação e preparação de profissionais para:

·         enfrentar o desconhecido e as incertezas dos novos tempos;

·      através do autoconhecimento, desenvolver potencialidades que alimentem a capacidade de decisão baseadas na força mental e na intuição;

·        habituar-se a familiarizar-se com novas tecnologias em curto espaço de tempo;

·   desenvolver habilidades de transformação e adaptação a novas situações e contextos desconhecidos;

·       desenvolver atitudes e posturas diferenciadas e positivas em momentos de tensão e incertezas; e

·    criar mecanismos apropriados para formulação de estratégias não usuais para lidar com situações complexas. 

3. Será preciso criar um novo modelo de empresa, que requeira recursos financeiros, instalações, máquinas, materiais, processos e pessoas, mas que tudo isso seja compreendido como parte de um ecossistema abrangente em que a concorrência e as forças competitivas simplesmente alimentem a criação de novas oportunidades para o desenvolvimento e crescimento do ser humano. Esse novo modelo de empresa precisará estar integrado a um conjunto de regras de engajamento no qual o objetivo maior será sempre o da criação de valores sustentáveis para a o futuro da humanidade.

4. A ética empresarial não será meta, mas sim premissa. Os gestores do futuro não deverão preocupar-se com regras que estabeleçam o que é ou não ético, pois todas as negociações, operações e transações serão absolutamente transparentes, respeitando porém, as questões culturais e os direitos humanos.

5. Como as economias dos países continuarão a sofrer interferências diversas e, como consequência, apresentar diferentes comportamentos e resultados micro e macro econômicos, far-se-á necessário criar mecanismos regulatórios e de controles mais consistentes e que privilegiem o fortalecimento do comércio internacional e o respeito às leis de cada país.

6. Projetando que as empresas possam fazer parte de um ecossistema, é possível imaginar como seriam geridos alguns dos elementos que compõem a gestão das organizações:

·         Gestão do Marketing

Construção de relações duradouras baseadas na confiança e cooperação, através de alianças e parcerias permeadas por toda a organização.

·         Gestão operacional

Os instrumentos da eficácia operacional seriam construídos, muito menos através dos indicadores de performance e desempenho tradicionais e muito mais no grau de satisfação e realização das pessoas, já que elas teriam o conhecimento do exato equilíbrio entre a geração do lucro merecido e a contra-partida da alegria de fazer parte de uma equipe organizacional vencedora.

·         Gestão da Inovação e da tecnologia

Sendo parte relevante da estratégia, a gestão da inovação e da tecnologia seria conduzida de forma a integrar cada processo evolutivo dentro do ecossistema do qual a empresa faria parte e mantendo, na criação de valor, a premissa sob a qual nortearia seu papel.

·         Gestão Financeira e contábil

É óbvio que a contabilidade continuaria sendo gerada no método de partidas dobradas, tendo porém na contabilidade gerencial o aperfeiçoamento para geração das informações essenciais à boa gestão. Já, o ganho financeiro fácil não mais deveria fazer parte de qualquer atividade empresarial e a gestão das finanças voltaria às suas origens, extinguindo-se as operações complexas que incentivam o surgimento do “cassino financeiro” e do ganho fácil.

·         Gestão das pessoas

Nesse campo, relembro a visão de Clemente Nóbrega em seu livro “Em busca da empresa quântica”. Em outras palavras, as empresas seriam pessoas em processo! Seriam duas entidades que se confundiriam em si mesmas. A nova lógica na gestão de pessoas teria como premissa a participação de todos, onde cada um jamais sentir-se-ia um passivo. Cada um saberia perfeitamente seu papel dentro do contexto estabelecido e todos estariam essencialmente engajados na busca do objetivo comum. Como disse Nóbrega: “Uma empresa inteligente. Uma empresa em que todos queiram a mesma coisa, sem imposição, sem controle, sem medo e sem que ninguém tenha de comandar.”

Para finalizar, gostaria de enfatizar que, provavelmente, o essencial da gestão nas empresas não mais estará presente dentro da lógica que aprendemos e que fomos educados dentro das universidades e das próprias organizações.

Talvez tudo isso faça sentido se o ser humano tiver a conscientização plena de que sua passagem pela terra só terá significado quando buscar, decididamente, a felicidade do outro. Esse é o segredo! Como já escrevi em outras ocasiões: “tão simples, mas ao mesmo tempo, tão complexo e difícil para nós, pobres mortais!”

Autor: Carlos A. Zaffani – Consultor em  Gestão de Empresas