Há alguns anos escrevi um artigo com o título “Ebitda – virtudes e defeitos” no qual mostrei do que se tratava, contei um pouco de sua história, apresentei exemplos, suas virtudes, defeitos e tendências para o futuro. Passados vários anos e conforme previmos, o EBITDA continua “sendo um indicador relevante e importante, porém com uma melhor compreensão de suas limitações”.
Assim, por continuar sendo um indicador muito utilizado, apresentamos novamente neste espaço, a fim de relembrar vários pontos de nossa abordagem do passado e agregando outros aspectos e pontos importantes sobre sua aplicação e validade. Mas, afinal de contas, o que é o EBITDA? Ele é ou não uma boa ferramenta de avaliação? O EBITDA mede, realmente, o fluxo de caixa? Por que tantas empresas com ações negociadas nas bolsas de valores fazem questão de apresentar o resultado do EBITDA?
Novamente quero ressaltar que essas e outras questões continuam sendo objeto de discussões nos meios acadêmicos e financeiros e ao trazer o tema outra vez, não tenho a pretensão de esgotar o assunto, mas uma vez mais, apresentá-lo para aqueles que não o conhecem, aprofundar a reflexão para os que já o conhecem razoavelmente e trazer à tona, antigos e novos pontos que podem estar passando desapercebidos por empresas que o adotaram sem ressalvas.
O que é o EBITDA ?
EBITDA - Earning Before Interests, Taxes, Depreciation and Amortization - em português significa “Lucro Antes dos Juros, Impostos, Depreciação e Amortização”, também conhecido como LAJIDA. Muito embora, o EBITDA também seja considerado por muitos e apresentado como “Fluxo de Caixa Operacional (Operational Cash Flow)” o mesmo leva em conta apenas o desempenho operacional da empresa e não reflete o impacto no resultado, dos itens extraordinários, das despesas com investimentos e das mudanças havidas no capital de giro.
Relembrando um pouco de sua história...
O EBITDA tornou-se conhecido e ganhou notoriedade no mercado norte-americano na década de 70. Nessa época, o EBITDA era utilizado pelos analistas como uma medida temporária para avaliar o tempo que seria necessário para que uma empresa, com grande volume de investimento em infraestrutura, viesse a prosperar sob uma perspectiva de longo prazo. Ao excluir os juros dos recursos financiados e somando-se a depreciação dos ativos, os investidores conseguiam projetar uma possível medida de performance futura da empresa, considerando apenas a atividade operacional.
Ocorre que, com o passar dos anos, o EBITDA foi se tornando cada vez mais popular, chegando a ser comparado, por muitos, como uma aproximação do Fluxo de Caixa e passou a funcionar como um “amortecedor” (quando mal utilizado) em relação ao julgamento do mercado quanto ao efetivo “lucro líquido” da empresa.
Relembrando como o EBITDA é apurado...
O cálculo do EBITDA é muito simples: ao Lucro Operacional Líquido antes dos impostos adicionam-se os juros, depreciação e amortização.
EXEMPLO: Demonstração do Resultado do Exercício findo em 31/12/200X ($000)
· Receita Líquida de Vendas.................... ......... 10.000
· (-) Custo dos Produtos Vendidos ................... 4.800
· Lucro Bruto ................................................... 5.200
· (-) Despesas Operacionais
Vendas........................................... 1.500
Administrativas e Gerais............... 550
Despesas menos Rec.Financeiras.. 250 2.300
· Lucro Operacional ..................................... 2.900
DETERMINAÇÃO DO EBITDA
· Lucro Operacional.......................... 2.900
· (+) Depreciação / Amortização
inclusa no CPV e Despesas
Operacionais............................ 180
(+) Desp.menos Rec.Financ....... 250
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· EBITDA..................................... 3.330
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Resumidamente, há alguns anos os principais argumentos dos defensores do EBITDA eram:
· Por eliminar os efeitos dos financiamentos e decisões contábeis, sua utilização pode fornecer uma comparação relativamente boa para o analista pois mede a produtividade e a eficiência do negócio;
· O EBITDA (como percentual de vendas) pode ser utilizado para identificar empresas que são as mais eficientes operadoras dentro de um determinado segmento de mercado;
· Pode ser utilizado para comparar a tendência de lucratividade nas indústrias pesadas (ex: siderurgia e automobilística) até as de alta tecnologia porque remove da análise, o impacto dos financiamentos de grandes inversões de capital;
· A variação percentual do EBITDA de um ano em relação a outro mostra aos investidores se uma empresa consegue ser mais eficiente ou aumentar sua produtividade;
· O EBITDA é uma excelente ferramenta de medição para organizações que apresentam uma utilização intensiva dos equipamentos (mínimo de vinte anos).
Já os críticos do indicador argumentavam:
· É comum empresas contratarem financiamentos e empréstimos para alavancar suas operações. Assim, é normal apresentarem despesas financeiras superiores às receitas. Outrossim, como também é comum as empresas apresentarem Imposto de Renda e Contribuições sobre seus lucros operacionais, é fácil presumir-se que o EBITDA seja superior ao lucro líquido, sendo que, em muitos casos, o mesmo é positivo, mesmo com a linha final da demonstração de resultados apresentando prejuízo líquido;
· O EBITDA não considera as mudanças no capital de giro e, portanto, sobrevaloriza o fluxo de caixa em períodos de crescimento do capital de giro;
· O EBITDA pode dar uma falsa ideia sobre a efetiva liquidez da empresa;
· Não considera o montante de reinvestimento requerido, especialmente nas empresas que apresentam ativos operacionais de vida curta (três a cinco anos);
· Ele ignora as distinções existentes na qualidade dos fluxos de caixa originados de diferentes práticas contábeis (nem todas as receitas geram caixa!);
· As companhias da chamada “nova economia” tentam convencer os investidores de que devem ser avaliadas, exclusivamente, com base no EBITDA, desconsiderando-se até a hipótese de prejuízo e com isso, conseguem “ludibriar” investidores leigos ou mal informados;
· A aparente hipótese de estar livre de manipulações caiu por terra com o escândalo da Worldcom, quando esta reconheceu US$ 7 bilhões de despesas operacionais como despesas financeiras, o que provocou profunda supervalorização (aumento) do EBITDA;
· Por ser de fácil apuração o EBITDA é frequentemente utilizado como a mais importante medida de performance do resultado de muitas empresas. Entretanto, seu resultado pode dar uma falsa ideia do verdadeiro potencial de investimento de uma companhia, justamente por não refletir adequadamente a verdadeira habilidade na geração de caixa para continuidade das operações.
Com o passar do tempo...
Mais especialmente nos Estados Unidos, as companhias que davam excessiva ênfase ao EBITDA em suas comunicações sobre os resultados voltaram a focar muito mais no “lucro por ação” e dando mais atenção à outros indicadores.
De outro lado e centrando mais na realidade brasileira, o EBITDA continuou sendo muito utilizado e, de forma significativa, parece que passou a predominar um relativo consenso de sua validade como instrumento de estimativa do “Fluxo de Caixa Operacional”. Para se ter uma ideia, na última década passou a ser considerado pela maioria dos profissionais e analistas do mercado de capitais como um dos (ou principal) indicador da liquidez de uma empresa.
EBITDA x Fluxo de Caixa Operacional
Nos últimos tempos, essa controvérsia parece ter tomado maior dimensão, de tal forma que mereceu um estudo (Autores: Talisa Rezzieri, Darci Schnorremberger e Diane R.M.Reina – Universidade Federal de Santa Catarina) aprovado para o 9º Congresso USP de Iniciação Científica em Contabilidade (Julho/2012), cujo objetivo era verificar a aderência entre o EBITDA e o Fluxo de Caixa Operacional e foi baseado em amostra de 31 empresas que integravam a carteira teórica da Bovespa e que publicaram a Demonstração do F.C.O. desde 2005.
As conclusões desse estudo surpreenderam porque concluiu que o “EBITDA é instrumento confiável para estimar o Fluxo de Caixa Operacional, visto que se encontrou aderência entre as variáveis em 98% das observações do estudo”. Todavia, concluiu também que “ao comparar os resultados da presente pesquisa com as conclusões de outros estudos similares, constatou-se que as conclusões eram divergentes”.
Minhas considerações finais
Em complemento à nossa abordagem e baseado em tudo de tenho lido e estudado sobre o EBITDA ao longo dos anos, entendo que:
- O EBITDA é um indicador válido nas análises e avaliações de investimentos e performances das empresas, porém somente quando também acompanhado de outras que levam em consideração inúmeros outros critérios tradicionais.
- Faço parte daqueles que entendem que o EBITDA jamais deve ser considerado um substituto do Fluxo de Caixa Operacional.
- Trata-se de um indicador muito controverso e alinho-me com a opinião de Warren Buffett (um dos mais respeitados investidores do mundo) expressa em um relatório para os acionistas da Bershire Hathaway que dizia algo como: “Nós nunca compraremos uma empresa quando os gerentes se baseiam no EBITDA!”.
- O EBITDA continua sendo muito utilizado por empreendimentos na busca de investidores, porém é preciso estar atento e desconfiado se a ênfase for demasiada.
- Como muitas empresas introduziram e passaram a adotar o EBITDA como indicador para pagamento de bônus executivos e gerenciais, é preciso ser bastante cauteloso pois como seu resultado tende – quase sempre – a ser positivo, pode contribuir para a descapitalização e destruição da riqueza de uma organização.
- Ele também tem sido utilizado pelos analistas como uma aproximação da agregação de valor de uma empresa, porém concordo com aqueles que entendem que não existe nenhuma vinculação comprovada entre o EBITDA e o valor da empresa.
- Também tem sido muito adotado na compra e fusão de empresas sendo calculado com base em múltiplos de EBITDA, o que pode trazer consequências desagradáveis para investidores ou sócios, pois uma empresa poderá ser superavaliada e os retornos futuros serão bem menores do que os projetados.
- Por fim, reforço minha impressão já expressa no passado de que o EBITDA tem limitações e, portanto deve requerer, por parte de analistas e especialistas, a continuidade de estudos que auxiliem os profissionais a aprimorar as avaliações e análises das empresas.
Espero que este artigo possa continuar contribuindo um pouquinho mais na discussão de tão importante tema para investidores, executivos, contabilistas e demais profissionais interessados.
Bom trabalho e até breve!
Autor: Carlos A. Zaffani - Consultor em Gestão de Empresas
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